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A obra de Deus pode ser comparada a uma mercadoria qualquer?
Nestes últimos dias, observamos com tristeza a que ponto chegou a situação de pregadores e cantores evangélicos. Como conhecedor de causa – há anos integro diretorias de grupos jovens e organizo eventos -, tenho sentido a dificuldade que é conseguir trazer um pregador ou cantor de renome para participar de uma programação em nossas igrejas, onde não se pode cobrar ingresso.
Para sermos justos, temos que analisar a questão de três ângulos. Primeiro, a falta de sensibilidade daqueles que estão à frente de igrejas, trabalhos e eventos quando se esquecem das necessidades básicas do próximo. Independente de servirmos ao Senhor, precisamos comer, nos vestir e calçar, pagar a escola das crianças e honrar as demais responsabilidades que, a todo momento, nos fazem lembrar que, embora os pastores e cantores sejam chamados de “anjos’, eles precisam de tudo isso.
A falta de sensibilidade – e até de amor – se reflete quando um pastor ou um cantor vai a uma igreja e participa da programação, dando tudo de si: canta, prega, ora, às vezes atende alguns problemáticos crônicos após o culto, sofre e se desgasta, pois na maioria das vezes está só, longe da esposa, dos filhos e de casa. No final de toda a programação, alguém dá um tapinha nas costas e diz; “Muito obrigado, meu irmão, que Deus te abençoe!’. Vale lembrar que muitos convidados não recebem nem esse tipo de “gratificação”.
O que as pessoas precisam entender é que muitos obreiros e cantores, ainda que se dediquem exclusivamente ao ministério dado por Deus, não estão com a conta recheada de dinheiro nem possuem uma bela casa à beira do lago e tampouco um carro importado na garagem. Eles se lançam de um a outro extremo do País para ajudar na obra e, certamente, esperam receber alguma contribuição da igreja para que possam custear suas despesas e continuar cumprindo a árdua missão. Esses trabalhadores precisam – e é bíblico – viver do seu salário, ou seja, daquilo que conseguem amealhar em suas andanças.
Mas o quadro que se vê hoje no meio evangélico é preocupante. Eis o segundo ângulo da questão: as cobranças exorbitantes que são feitas quando convidamos alguém para pregar e/ou cantar em alguma
programação de nossa igreja. Quem já passou por isso sabe o que falam do outro lado da linha: “Sim, irmão, posso estar com vocês, estou cobrando apenas “x” salários para isso”. Quando se trata de pregadores, esse “x” varia entre cinco, oito, 10 salários mínimos. Quando o convite é estendido a um cantor, esse “x” muitas vezes é de tirar o fôlego, cujo valor vai da venda de no mínimo 100 discos (o que é, na minha opinião, muito justo), até U$ 8.000 (oito mil dólares).
É lamentável, mas tanto faz dizer que aquela é uma programação da igreja ou um show, onde a cobrança de ingressos é permitida, uma vez que os valores permanecem inalterados. E o que pesa mais para as igrejas, além de desembolsar esse cachê, são as exigências incluídas no mesmo pacote, como passagens e hospedagens para acompanhantes, obrigatoriedade de hotel cinco estrelas e motorista exclusivo.
A obra de Deus deve ser formada por quem prioriza a propagação do evangelho. Provocam indignação pessoas que se dizem evangélicas, até causando burburinho na mídia por terem se “convertido”, mas que na pratica só pensam em extorquir o mesmo povo a que julgam pertencer. Ser nascido de novo, sem dúvida, não comporta essa postura nefasta.
Verdade seja dita, e este é o terceiro ângulo da questão, ainda temos grandes pregadores e excelentes cantores que primam em fazer a obra de Deus, não dando tanta importância ao fator dinheiro”. Talvez por isso sejam bem-sucedidos.
Há algum tempo, estávamos na minha igreja preparando um congresso. Liguei para um certo pregador que descaradamente me cobrou 10 salários mínimos para aceitar o convite, mas me faria um abatimento deixando o “serviço” em seis salários. Eu não estava ainda acostumado com isso e fiquei pasmo, optando por não traze-lo nessas circunstâncias. Liguei para outro – esse, pastor em uma igreja no interior do Estado do Ceará e que de pronto atendeu o convite, não perguntando quanto iria ganhar; apenas indagou se tínhamos condições de bancar a passagem aérea para todo o percurso, caso Contrário viajaria de ônibus parte do trajeto. Que diferença! Final da história: Deus usou de tal maneira esse pastor que, somando a oferta arrecadada no final do congresso com a que um obreiro de um campo próximo havia doado, ele levou para sua cidade aproximadamente quatro vezes mais o que o primeiro tinha “cobrado” para pregar. E observem, ele não pediu nada.
Todos os que vivem do evangelho devem ser recompensados pelo trabalho que realizam. Entretanto, no momento em que se lida com a obra de Deus como se fosse uma mercadoria qualquer, então a questão se torna delicada. Quando isso acontece, sentimos falta de ouvir biografias de obreiros que já descansam no Senhor. Podemos citar os pastores que ao ser enviados para pastorear, não pergunta quanto vai ganhar, onde vai morar, quantos membros tem na igreja, mas arregaça as mangas, embrenha-se na Seara do Senhor, conseguindo ganhar muitas almas para Jesus. Essa recompensa, com certeza, não tem preço e ninguém a pode tirar.
A obra de Deus deve ser encarada com mais seriedade.
Extraído
Postado por:Pb.Ademilson Braga